Revista Diário - 11ª Edição - Outubro 2015

E sse é um dilema que desapareceu, mas continua tema para muita con‐ trovérsia. Aqui no Brasil, ele é antigo e soou como um grito de protesto quando o conselheiro Nabuco de Araújo, pai de Joaquim Nabuco, no século 19, lançou em discurso famoso o dilema: “Reforma ou revolução?”, para enfrentar a encruzilhada em que o país estava. A reforma era o antídoto contra a re‐ volução que se julgava inevitável desde que um sistema político entrava em colap‐ so. Hoje, a palavra que dominou o pensa‐ mento político de mais de um século está sepultada. Entrou para o rol dos arcaís‐ mos. No mundo moderno, os sistemas desmoronam pelas suas contradições, e não pelo uso da força. O comunismo, que tanto pregou a revolução, não foi vítima dela, ao contrário do que diziam muitos profetas, mas de si mesmo. Mas a palavra reforma não teve o mesmo destino. Continuou a circular e foi a única sobrevivente do sis‐ tema comunista. Lênin dizia que foi o primeiro grande ataque da burguesia contra o proletariado a formula‐ ção revisionista de Eduard Bernstein (1850‐1932), que afirmava ter Marx e Engels uma visão unilateral da história econômica. Bernstein propunha que fosse descartada a ideia da revolução, na busca de um socia‐ lismo que promovesse, gradualmente, a democracia e a elevação material do proletariado. Essas ideias fo‐ ram os fundamentos da social democracia alemã, ba‐ sicamente revisionista. Por outro lado, o capitalismo, na mes‐ ma direção, apontou para a necessidade de promover mudanças em suas concep‐ ções na busca de torná‐lo menos egoísta e poder enfrentar as teses comunistas. O ca‐ minho? As reformas. Daí surgiu o que se chamava de neoliberalismo, cujas ideias podemos dizer que foram sistematizadas, no pensamento europeu, nos tempos mo‐ dernos, por Raymond Aron, entre outros. Assim, por caminhos diferentes e pela marcha do próprio tempo, revisionismo marxista e reformismo capitalista se en‐ contraram como uma coisa só. O objetivo é viabilizar o sistema que a globalização tornou único, ou seja, da economia de mercado e democracia liberal. A social democracia e o neoliberalismo passaram a ter os mesmos objetivos: destruir o Es‐ tado do bem estar social, inimigo do Es‐ tado patrão e assegurar a livre circulação do capital, sem fronteiras, como exige o processo de abertura de mercados e a globalização. Mas “nem tudo que reluz é ouro“. Essas formulações perfeitas são incapazes de superar suas próprias con‐ tradições. A crise da Ásia pode não ser uma crise da Ásia, mas uma crise profunda do capitalismo e de seus dog‐ mas. Pode apontar para uma época de contração, de de‐ flação, de recessão, imprimindo velocidade àquilo que hoje é a grande ameaça à humanidade: o homem sem emprego, as nações sem identidade e um superestado mundial financeiro governando ummundo que é injusto e desumano. ● Revista DIÁRIO - Outubro 2015 - 28 Senador daRepública JoséSarney ARTIGO Não foi por outro motivo que o papa João Paulo 2º assumiu, à certa altura, a missão de denunciar os dois sistemas e seus derivados, pedindo uma ordemmundial mais próxima de Deus e da felicidade do homem. Ex-presidente do República, senador pelo Amapá, Membro da ABL e da Academia de Ciências de Lisboa;escreve no Diário do Amapá, todos os domingos Reforma ou revolução?

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