Revista Diário - 14ª Edição - Março 2016

H á alguns anos, num artigo como es‐ te, tratei da inacreditável promis‐ cuidade dos que lidam com o siste‐ ma financeiro e o setor privado a ele cor‐ relato. Essa coabitação custa permanen‐ tes denúncias e levanta suspeitas sobre instituições e pessoas. O país tem se mostrado, com todas as suas luzes de alerta, impotente para coi‐ bir práticas e procedimentos considera‐ dos, no mínimo, duvidosos. O que fica transparente, independentemente de pessoas e tempos, é que o mecanismo (conjunto de legislação, resoluções, ins‐ truções normativas e aparelho gerencial do setor) é vulnerável a qualquer vigilân‐ cia. Os poderes pessoais daqueles que co‐ mandam a área permitem decisões sub‐ jetivas, sempre lastreadas na invocação do bem público, e com ele não se ajustam. Nada mais urgente, independente‐ mente do resultado das investigações que se processavam no Senado, na CPI do sis‐ tema financeiro, do que uma revisão des‐ sa legislação. Não se concebe que as mes‐ mas pessoas circulem nos mesmos pos‐ tos, detentoras de informações privilegia‐ das, conhecedoras do mecanismo da to‐ mada de decisões, indo e vindo, entre o setor público e o setor privado, sem ne‐ nhuma restrição legal, acusadas de obte‐ rem neste grandes fortunas e naquele de provocarem incomensuráveis prejuízos. Por absurdo, vamos pensar no sr. Paul Vocker, ex‐presidente do Banco Central dos EUA, preso sob acusação de vazar in‐ formações e beneficiar‐se, recusando‐se, perante o Congresso americano, de assi‐ nar um termo de compromisso de dizer a verdade. O que aconteceria? O arcabouço de proteção ao sistema capitalista america‐ no é severo. Dele depende o funciona‐ mento da economia, que exige o combate às práticas desleais, aos monopólios e oli‐ gopólios, tendo como guarda a solidez, le‐ gal e moral, do Federal Reserve, o Banco Central deles. As Constituições brasileira e ameri‐ cana asseguram o direito individual do cidadão de ficar calado e não se incrimi‐ nar. Mas desse dispositivo ninguém pode concluir que está assegurado o direito de mentir. Lott, quando deu o golpe de novem‐ bro de 1955, acusado de ter negado ao presidente Carlos Luz a verdade sobre a situação militar, respondeu: "Tive uma restrição mental". Aqui queremos um capitalismo sem risco: acordos de preços, absorção de pre‐ juízos pela sociedade e acesso para frau‐ dar o jogo aberto do mercado financeiro. Das crises devemos tirar ensinamen‐ tos. É necessário acabar com essa promis‐ cuidade. Precisamos de uma legislação dura, de um saneamento profundo e ime‐ diato das práticas reconhecidas pela na‐ ção como contrárias ao interesse e à mo‐ ralidade públicos. A Lei da Quarentena não poderia ser postergada, que se faça agora, no calor do debate, para que a legislação que vier não tenha panos quentes. ● Revista DIÁRIO -Março 2016 - 28 Senador daRepública JoséSarney ARTIGO É inacreditável que alguns gênios da área financeira, vistos com desconfiança pela sociedade, com desenvoltura entrem no Banco Central e o deixem depois de aprender a ficar milionários. Lembro Vieira quando falava dos vice-reis das Índias: "Entram pobres nas Índias ricas, saem ricos das Índias pobres". Ex-presidente do República, senador pelo Amapá, Membro da ABL e da Academia de Ciências de Lisboa;escreve no Diário do Amapá, todos os domingos AS ÍNDIAS RICAS

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