Revista Diário - 30ª Edição
Diário – A senhora diz que o seu sonho é que a edu- cação vire prioridade no país. É possível fazer isso? Tabata - É possível. E aí eu conto principalmente com aqueles que aos trancos e barrancos puderamter umpouco de educação. E pra explicar, a gente esquece o quanto o nosso Brasil não foi educado. De cada dez adultos no Brasil, sete não conseguem entender textos mais complexos, ou seja, não foramnemplenamente alfabetizados. E aí sempre que encontro alguémque commuita dificuldade conseguiu terminar o ensinomédio, conseguiu fazer umcurso técnico uma faculdade, eu digo: foi muito difícil, mas a gente já é parte de um pequeno grupo no país. Então, se a gente não lutar pra colocar a educação na pauta, vai demorar ainda muito tempo pra população conhecer e saber a importância da educação. Diário – Que soluções a senhora proporia para en- frentamento na questão de que apenas 12% das pes- soas adultas possuírem ensino superior no Brasil, e mais da metade não ter o ensino médio, por exemplo. Tabata – Quando a gente fala de educação básica, pra mimsão três áreas que são fundamentais. Uma delas é o fi- nanciamento. A gente agora está discutindo o Fundeb, que é o Fundo Nacional de Educação Básica, que cobre seis de cada dez reais dessa educação, vence no próximo ano, e a gente tem quer desenhar um financiamento que leve mais equidade para os municípios, especialmente os mais po- bres, mas que também levemais eficiência para a educação. Que a gente tenha a certeza de que cada centavo que a gente investe, vai de fato para o aprendizado. Tem uma segunda pauta, que é das mais antigas, e com mais dificuldade, a questão dos professores. A gente temquemelhorar a valo- rização, a formação, que hoje é muito teórica. Diário – Melh rar a qualidade do professor... Tabata – Não. Melhorar a qualidade da formação que se tem no ensino superior. Diário – Significa mais investimento... Tabata – Não só isso. É você mudar o que o professor aprende na faculdade, por exemplo. Hoje é muito teórico, pouco prático. A gente temmais da metade dos pedagogos se formando em ensino à distância, sendo que pra mim é uma profissão tão difícil ou mais do que a de médico, e um bom médico tem que aprender a fazer a cirurgia, e não só a teoria. A gente tem que melhorar o salário, melhorar as condições, porque hoje os alunos com as melhores notas no Enemnão queremser professores. E a gente temos alu- nos com as piores notas, tirando as exceções, obviamente, querendo ingressar na carreira. Então, se a gente fala de fi- nanciamento, e fala de professores, pra mim sobra uma pauta, que é a de ensino técnico, porque no Brasil temos uma visãomuito elitista. Dizemos que ensino superior é pra rico, e para o pobre, o ensino técnico, mas no fimdas contas só quem tem oportunidade é quem faz os dois. Quem é pobre, mesmo, não faz nem o ensino médio. E aí, com este mundo que estámudando, comnovas profissões, coma tec- nologia, com a impressão 3D, etc. etc., a gente tem que en- contrar uma maneira de ser todo contínuo. Explicando: a gente tem o ensino técnico no ensino médio, depois você faça dois anos de um técnico tecnólogo, e quando for fazer faculdade, não tem que fazer cinco anos do zero, tem que ver tudo o que você aprendeu, e só fazer o que falta, mais um ou dois anos para sair com o diploma, porque já dizem que a gente vai ter cinco ou oito profissões ao longo da vida. Então, não vai ser como é hoje: estuda, trabalha e aposenta. Diári - O bom professor não basta ser apenas um bomprofessor, tem que ser o bomprofessor... Tabata – Temque ser umbomprofissional. Falo profis- sional porque temmuita gente que não entende ainda a im- portância desta carreira. Diz: ah, você é professor e fazmais o quê? Então, a gente tem que mudar esta cultura, de en- tender que é uma profissão que requer muito conheci- mento, que você tem que ficar se atualizando, que é uma profissão tão prática quanto a de médico, de engenheiro e a de advogado, e isso passa pelo que a gente já falou: me- lhores salários, melhores condições de trabalho, mas tam- bém uma formação que é mais qualificada. Diário – Por que a senhora, depois de toda essa pre- paração que conseguiu na Harvard, resolveu voltar para o Brasil, se tinha tudo pra ir mais à frente, lá? Tabata – Na faculdade, eu comecei a estudar Astrofísica, que é uma coisa muito doida, que quer dizer que eu estu- dava o Universo; eu queria ser cientista; no segundo ano, mudei de carreira para Ciência Política, porque ficavamuito evidente o quanto aminha vida eramuito diferente de todo mundo da periferia onde eu morava. E aí era aquela coisa: Enquanto eu tive uma trajetória demuita oportunidade, demuita chance, na educação, ninguémmais aomeu redor teve. Eu perdi umnúmero semfimde amigos, com14, 15, 16anos de idade, pras drogas, para a violência, pro crime; perdi tambémmeu pai com39anos de idade, tambémpara as drogas. Conheço vários amigos que não completaramo ensinomédio e eu tenhomuita consciência de que eles não sãomenos esforçados oumenos inteligentes doque eu, simplesmente não tiveramchance. Revista DIÁRIO - Edição 30 - 09 “ “ De cada dez adultos no Brasil, sete não conseguem entender textos mais complexos, ou seja, não foram nem plenamente alfabetizados. →
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