Pablo –
Nós, no Amapá, sempre tivemos um trabalho
muito forte nessa área, resultando na consolidação de um
laboratório estruturado, comumnível técnicomuito
elevado, ao ponto de ser, hoje, o único banco
criminológico de DNA da região Norte, comomaior
acervo de dados genéticos do Brasil. Antes, entretanto, eu
passei por treinamento na Polícia Federal.
Diário – Qual foi ametodologia usada na operação?
Pablo -
Várias equipes foramdeslocadas para o local,
mais especi icamente de Recife, Pernambuco, que foi a
base da operação. Rio de Janeiro e Brasília, constituídas
de pro issionais de várias especialidades na área pericial.
Fiquei na base de Brasília, no laboratório da Polícia
Federal, encarregado de receber amostras para
cruzamento de dados necessários à identi icação.
Diário – De que era constituído essematerial?
Pablo –
Tratavam‐se de fragmentos de músculos das
vítimas e material de familiares. Recebemos, no total, 51
amostras de vítimas, das quais apenas uma não foi
identi icada, porque não se tratava de material humano,
podendo, até mesmo, ser fragmento de algum animal
doméstico que se encontrava no voo.
Diário – Chegou a uma conclusão de initiva sobre as
causas do acidente?
Pablo –
A tese mais aceita é que pode ter havido um
congelamento da sonda que dá parâmetros de altitude e
velocidade, por exemplo, aduzindo‐se que numprimeiro
momento os pilotos não sabiamo que estavam fazendo,
perderam a noção de altitude e/ou velocidade, o que
pode ter sido decisivo para aquele desfecho trágico. Há
um conjunto de hipóteses que devem ser levadas em
conta, não só falha humana. Tive informações através da
Nasa, a Agência Espacial Americana, que entre a América
do Sul e a Europa é uma região de muitas ondas
eletromagnéticas de origemdo espaço, tanto que as
aeronaves sofremquando estão em altitude muito
signi icativa, através do impacto de raios. Pode ter
ocorrido que, para fugir de uma tempestade, os pilotos
tenhamoptado por subir mais, acabando por serem
atingidos pelos rádios decorrentes das ondas
eletromagnéticas.
Diário – O banco genético criminológico do Amapá é
uma realidade, e hoje é referência para o país. Como
funciona?
Pablo –
Trata‐se, semdúvida, de uma conquista
inestimável, porque através do banco genético já
conseguimos elucidar muitos crimes, tanto viabilizando a
condenação de culpas, como tambémna proclamação de
inocentes acusados injustamente da prática de crimes. O
Amapá saiu na frente, e hoje temos omaior acervo de
dados genéticos do país. Nós temos umbanco integrado
ao per il genético nacional, com amostras de condenados
e suspeitos da prática de crimes hediondos,
principalmente estupros, a partir de 2012. Isso foi
possível porque o Amapá ocupa o primeiro lugar no
Brasil emnúmero de condenados. Para que se tenha ideia,
só no Instituto de Administração Penitenciária, o Iapen,
coletamos 350 amostras entre o imde 2013 e 2014.
Diário – Como vocês conseguiramessa façanha?
Pablo – T
eve toda uma conversa com a direção do Iapen,
Sejusp, Delegacia Geral, Vara de Execuções Penais e
Ministério Público. Tudo foi feito e é feito dentro da
legalidade, sob o amparo de uma lei federal de 2012, que
obriga todos os condenados por crimes violentos,
hediondos, a se submeterem à identi icação criminal,
inclusive DNA. A parte técnica trabalhada não é medida
punitiva, mas sim administrativa, como objetivo de
ampliar e aprofundar o leque de investigação que resulta
tanto emuma eventual condenação como absolvição.
Diário – Muita gente acha que o exame de DNA é
direcionado apenas para investigações criminais,
como forma de atribuir culpabilidades...
Pablo –
Esse conceito precisa ser mudado, porque o
banco de dados armazenados tem sido e será vital para
encontrar pessoas desaparecidas, identi icar ossadas,
esqueletos encontrados. É tudomais amplo do que se
imagina. O repertório judicial brasileiro, e mesmo
mundial, é rico em exemplos de acusados de praticar
crimes acabarem se transformando em vítimas, porque,
muitas vezes, são acusados através de reconhecimentos
feitos combase no emocional, oumesmo pelas
circunstâncias do crime, mas acaba se comprovando
através do exame de DNA que é inocente.
Diário – Já aconteceu algumcaso assimno Amapá?
Pablo –
Já, sim, semdúvida, vários casos. Omais recente,
que marcoumuito, foi umhomicídio ocorrido dentro do
Iapen. Umpreso provisório tinha praticamente acabo de
dar entrada, e foi acusado pelos demais detentos de ser o
autor do crime. Só que o verdadeiro autor foi identi icado
por nós através de uma mancha de sangue na camisa
dele. Fizemos o exame e icou comprovado ser ele o autor
do homicídio. Se não fosse o exame de DNA, o verdadeiro
culpado icaria impune, enquanto o ‘’laranja’ seria
condenado por um crime que não cometera.
Revista
DIÁRIO
- Novembro 2015 -
57
Operaçãode resgate, noOceanoAtlântico, às vítimas e
destroços doAirbus 330que caiu no oceanoAtlântico com
228pessoas abordo, em2009.