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Aprimeira mudança radical na minha vida, desde odia que saído hospital, éque fiquei

complemente estéril. Passei anão termais nenhuma atividade sexual, fiquei sem

lubrificação, sem ereção... Por que estou dizendo isso?Agradeçopublicamente

à

Consolação, minha esposa, pelo respeito que ela tempormim; quando adoecieu tinha 59

anos, aConsolação nunca colocou essas coisas como adiscutir, foi oque sobroupra mim.

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monstrar a gratidão que sinto por ele. Imediatamente via–

jei para São Paulo, no dia 11 de maio, e procurei um mé–

dico indicado por várias pessoas que já haviam se tratado

com ele. Antes fui à Igreja Guadalupe com o padre Dante

e recebi extrema-unção, que hoje é unção dos enfermos.

Luiz Melo - Caiu um desespero?

César Bernardo - Não, graças a Deus! Chorei muito,

mas sem desespero... Me arrependi de muita coisa que

não

fiz.

Mas foi um choque quando fiz os exames em São

Paulo e o câncer foi constatado. Caiu como uma bomba a

confirmação, que foi dada pelo doutor Fernando Nasci–

mento, aqui no Hospital São Camilo. Eu estava com a

minha esposa, a Consolação. Meu filho, o Tito, balbuciou:

"Papai é câncer!". Odia sumiu da minha cabeça...

Luiz Melo - Você teve medo da morte?

César Bernardo - Medo não... Eu não tive medo da

morte, mas entrei em desespero porque eu tinha muitos

planos na minha cabeça; não me apressei e de repente

esses planos foram interrompidos.

Luiz Melo - Existe uma frase que diz: "Deus não es–

colhe os capacitados, capacita os escolhidos". Você

acha que Deus o escolheu e ao mesmo tempo está

dando força para superar este mal?

César Bernardo - Pretensiosamente eu digo que

Deus me dá forças sempre. Eu acredito em Deus. Pra você

ter idéia, fui batizado um ano antes de nascer, porque o

padre errou na certidão de batismo; nasci em 1952, e na

certidão fui batizado em 1951. Eu sempre achei que duas

coisas valem a pena na vida: Deus e as pessoas.

Luiz Melo - Depois do baque da doença, como pas–

sou a ser o seu relacionamento com Deus?

César Bernardo - Passei a ser mais íntimo. Eu era

muito de rezar, mas depois disso sou muito de conversar

com Deus, falo com ele, coloco as coisas pra ele. Lá mesmo

no hospital, quando saí da sala de cirurgia, eu disse aos

meus filhos, à minha mulher e pra enfermeira lná, tomara

que ela venha a tomar conhecimento dessa entrevista,

que Deus me trouxe aqui pra me curar. Em alguns mo–

mentos se pode, sim, falar direto com Deus. Quando veio

o câncer eu passei a buscar orientações, a pergunta como

fazer...

É

melhor dialogar do que rezar muito.

Luiz Melo - Como tem sido o tratamento?

César Bernardo - Profundamente doloroso, muito

cansativo. Minha vida ficou muito sacrificada, mas o tra–

tamento tem sido muito bom; é como me disse minha

mãe, que vai fazer 93 anos no dia 22 de julho, pra eu não

reclamar de nada, procurar olhar ao meu redor que tem

gente muito pior, lembrar que sempre fomos muito po–

bres e sofremos muito já... (a entrevista foi interrompida

por um breve momento, porque César apresentou san–

gramento e logo em seguida foi retomada).

É

o tempo

todo assim, sangra o pênis, o nariz, como agora...

Luiz Melo - Quais as principais mudanças na sua

vida em função do câncer?

César Bernardo - A primeira mudança radical na

minha vida, desde o dia que saí do hospital, é que fiquei

complemente estéril. Passei a não ter mais nenhuma ati–

vidade sexual, fiquei sem lubrificação, sem ereção... Por

que estou dizendo isso? Agradeço publicamente à Conso–

lação, minha esposa, pelo respeito que ela tem por mim;

quando adoeci eu tinha 59 anos, a Consolação nunca co–

locou essas coisas como a discutir, foi o que sobrou pra

mim... O importante é que eu tenha ficado vivo; mas não

é fácil; às vezes tenho que ir 40 vezes ao sanitário durante

a noite, porque passei a ter duas doenças, neuropatia pe–

riférica, que me obrigou a andar de muletas, porque mi–

nhas pernas estão sempre dormentes e dá choque nos

pés, e outra doença, também em decorrência da cirurgia,

é neuropatia gastrointestinal. Eu não vou mais pra ani–

versário de ninguém, porque não tenho controle do meu

intestino.

Luiz Melo - Nesses sete anos e meio com câncer

você tem sentido falta da solidariedade humana?

César Bernardo - Não, pelo contrário, agradeço a

Deus todo dia por ter me colocado aqui no Amapá, nesta

terra, nesta cidade. Quando saí da universidade havia

muita escassez de curso superior no país todo, por isso

podia escolher qualquer estado para morar e trabalhar.

Eu vim para o Campus Avançado (Projeto Rondon) em

Macapá, conheci a Consolação e aqui estou há 44 anos,

Revista DIÁRIO - Edição 27- 09